31/03/2011

Velha Idalina Nova - do livro Raízes de Alvorada

A escola que conhecemos hoje situada na rua Taimbé foi criada em 21 de novembro de 1962, pelo decreto municipal 338. Em 12 de novembro de 1975 foi transformada de Grupo Escolar para Unidade de Ensino, pelo decreto 110/75.
 
Este texto foi retirado do livro que conta as origens com memórias, histórias e pertencimentos do povo de Alvorada - Raízes de Alvorada . em que o autor é José Carlos Carvalho - Poeta. Alvorada. RS

O site de Alvorada nos traz informações sobre o lançamento do livro .
" Velha Idalina Nova, saudades de uma  História, retrata um tempo em que uma humilde escolinha de madeira, de simples estrutura , fez tantas pessoas felizes, criando grandes nomes e gerando grandes artistas.
Trata-se de uma erma e um tempo que não voltam mais, hoje este poeta que vos escreve orgulha-se de ter sido aluno da escola Idalina de Freitas Lima, situada na rua Taimbé; em local diferente, porém, na mesma rua.
Um abraço do poeta "Carlinhos J.C." e boa leitura.

Dia 13/12/1961, nascia na vila Passo do Feijó (hoje Alvorada) distrito de Viamão, João Carlos Carvalho "poeta Carlinhos J.C." filho caçula deuma família de cinco irmãos , "josé Maria Judith, Marisa, Jorje Eli, e este que vos escreve". Filhos de João Carvalho e de Ilza Hina Leda Carvalho (naturais de Cachoeira do Sul e Santa Maria)
Março de 1969 , uma tarde ensolarada, lá ia minha irmã Judithe minha sempre e querida amiga Vânia Regina Mendes, ambas levando-me pelas mãos entregavam-me a minha primeira professora, que me ensinou o beabá da vida. Seu nome era Maria Aparecida:  preta, magra, 23 anos mais ou menos e muito carinhosa.  Entao ela abraçou-me e deu-me um beijo e colocou na sala de aula para que ali eu pudesse ter o meu primeiro encontro com a escrita.
A escola situava-se no terreno de uma igreja, até no inicio da rua Taimbé, esquina com a rua Inhá Porá ( hoje Itararé).
O uniforme era um guarda- pó, branco (tecido volta ao mundo), com uma tira nas costas, tipo guarda-pó de enfermeiro. Eram escolhidos através de votos, líder, vice-lider e 3º líder da sala de aula.
As aulas eram da 1ª a 4ª série, divididas em tres turnos, das 8h às 11h, das 11h às 14h e das 14h às 17h. Havia apenas três salas de aula que comportavam de 28 a 32 alunos, em suas classes simples e humildes. O amor porém reinava em cada coração.
 Havia na entrada do portão, pela rua Taimbé, a área da escola, sendo que à esquerda da primeira sala ficava a pequena biblioteca e a pequena cozinha da escola, onde ali eram preparadas as deliciosas merendas. Os horários de merendar eram das 9h15min às 9h30min, 12h15min às 12h30min e das 15h15min às 15h30min. Serviam as merendas dentro da sala de aula, em canecas plásticas, sempre variando. Serviam aveia, chocolate com bolacha, arroz doce, sopa e outras delicias inesquecíveis.
O nome da merendeira era Dorilda, morena clara, por volta dos 50 anos de idade. Tinha um dente de ouro à esquerda superior da boca.
Com muito carinho, lembro-me do nosso entao prefeito Elizardo Dutra Neto. Ao menos, uma ou duas vezes por mês, ele vinha até a escola para ver como estavam os alunos. Ele sua equipe nos traziam balas, cadernos, réguas, lápis, pirulitos, bolachas e, principalmente, muito carinho para cada aluno.
A educação física era praticada pela própria professora (nao haviam professores homens), às vezes realizada no fundo da escola, em frente à escola, ou em um campo baldio na esquina da escola. As brincadeiras eram varidas: pega-pega, esconde-esconde, pula corda, salto em altura, corrida de saco, Cooper, cabra cega e outras maravilhosas brincadeiras.
As Festas Juninas eram maravilhosas. Tinha a maior participação da comunidade que cooperava com muito amor. Tinha o casamento na roça....
Em 1968, Marisa, minha outra saudosa irmã foi escolhida a noiva. O noivo era baixinho, batia abaixo do seu pescoço. Era tudo simples, mas com muita alegria.
A comunidade ajudava na organização e em tudo. Havia arrasta-pé, quentao, pinhão, pipoca, nega maluca, pescaria, danças folclóricas e outras maravilhas.
Com bandeirinhas feitas de jornal, gibis, revistas e outros materiais, aquela velha escola era enfeitada. A fogueira era preparada e acesa em frente à escola, causando a maior alegria naquela pequena comunidade.
Em frente à sala 1 ficava o portão da escola, quase tão velho quanto a escola. Era um velho portão de ferro que ao abrir ou fechar fazia rec-rec. Havia lajes em volta da escola. Como não havia água encanada na cidade, era fornecida pela prefeitura até meados da decada de 1970.
Minhas professoras na vela escola foram: Maria Aparecida, Dóris (ex- diretora do Salgado Filho), Vânia, Claudete e Luci.
Lembro-me que na 2ª série, só pra estudar com a Dóris no ano seguinte, fiz de tudo para ser reprovado aquele ano, e consegui, pois nao queria perder o privilégio de ser seu aluno.
No ano seguinte, fiz a mesma coisa, porém nao deu certo o meu plano desta vez. Acabei mesmo indo para 3ª série. A Dóris era uma mãe para os seus alunos. Muitas vezes o carinho que eu não ganhava de meus familiares, eu ganhava da professora.
Aquela velha escola marrom e de madeiras velhas, muitas saudades traz a este poeta! Muitas saudades eu tenho do tempo que ali estudei, onde ali muitos conheceram e recebram o verdadeiro amor.
Lembro-me que certa vez a professora Dóris trouxe um gravados de pilhas. Levou-nos até o lado da escola defronte à cozina, e ali gravou nossas vozes. Ela ensinava músicas lindas aos nossos corações.
Naquela época, existia nas escolas alguns castigos: de joelhos no milho, tampinha de garrafa, atrás da porta, chapéu de burro. O castigo que nós meninos mais gostávamos, era de sentar ao lado de uma menina, já que na minha sala era menino com menino e menina com menina. Para a minha grande alegria, várias vezes recebi esse gostoso castigo.
Eu tinha o costume de puxar os cabelos das meninas, e dizia: "Bem feito. Bem feito!" Fazia isso principalmente com as que usavam rabinho de cavalo ou Maria Chiquinha.
Ainda na 2ª série, eu coloquei apelido em três colegas: a Vania eu apelidei de "Vania gafanhoto"; a Maria apelidei de "Maria fofoqueira" e "Maria polenta fria". Melquisadaque apelidei de "cabeça de palha". Mas o troco eu recebi. Ambos se reuniram e me apelidaram de Maria fofoca preta e eu chorava feito um bezerro desmamado. Quando paravam de me gozar eu recomeçava as gozações. Ah, logicamente com a participação dos demais colegas, alguns bem mais folgadões que eu.
Eram realizadas excursões para o Jardim Zoológico, alguns (inclusive eu) diziam Jardim "relógio". Era a alegria daquelas crianças quando o ônibus chegava para nos conduzir, e quando retornávamos do passeio.
Em 1970, alojaram-se alguns soldados do Exército no campo defronte à cozinha da escola, pois ali não havia rua. A Inhá Porá (hoje Itararé) vinha da rua São Borja e findava na Taimbé. Aqueles militares cortavam nossos cabelos, nos davam biscoitos, café com leite e, principalmente, muito carinho. Eram uns oito soldados. Acamparam-se ali durante uns quinze dias. Depois foram embora nos deixando muita saudade.
A professora Vânia nos fazia passar tudo a limpo. Às vezes eu fazia, às vezes minha irmã mais velha fazia para mim. A professora Mariana tambem era muito legal para os alunos.
Na época não descia ônibus aqui no bairro. O negócio era amassar barro quando chovia. As nossas ruas, inclusive a Getúlio Vargas, era chão batido. Nao havia outro jeito, se não caminhar um quilômetro para tomar o ônibus.
Então eu gostava muito de levar as professoras até a faixa.
Eu era magricela, virado só em ossos e orelhas.
Repeti a 3ª série e estudei entao com a professora Claudete. Para minha alegria, estudou comigo a Elaine, hoje(foi) diretora da escola Idalina de Freitas. Como  aluna foi bem aplicada, quieta e interessada. Ao contrário do que fui.
E finalmente, na 4ª série, a professora Luci, a exemplo das demais, era um amor de pessoa, ainda mais aturando alunos chatos que nem eu, mas sempre dando o mesmo amor a todos..
A área da velha escola dava acesso às salas 1 e 2, a sala 3, cuja entrada era pelo lado direito da escola, defronte às duas patentes. Não havia banheiro naquela época.
As salas 2 e 3 podiam ser abertas para poder se realizar os bailes, fazer apresentações de palhaços e mágicos ou também filmes. O primeiro palhaço ali a se apresentar foi o tambem mágico Bola-bola. E o primeiro filme foi "O menino da porteira", passado em uma pequena tela.
Por volta de 1974 veio a tão sonhada água encanada para Alvorada. E o primeiro banco de Alvorada, situava-se na Getulio Vargas com a Maringá, onde hoje é uma pizzaria( hoje estabelecimento de venda de carnes). O Banrisul funcionava das 9h às 11h e das 13h às 16h. Aguardávamos duas horas na fila enquanto os funcionários almoçavam.
A SOUL e a prefeitura situavam-se em prédios de madeira. Havia poucos telefones publicos em Alvorada que se emancipou no dia 17 de setembro de 1965.
No inicio da década de 1980, começou a construção da nova escola. Em seguida a nossa velha Idalina começou a despedir-se de todos nós. A escola pouco a pouco ia chegando no seu derradeiro destino: o fim. Para a alegria de muitos, em um outro terreno, ali nascia uma nova e bela escola. Afinal era o progresso chegando aqui no bairro, mas também para muitos representava tristeza e lagrimas daqueles que um dia, assim como eu, tambem foram alunos daquela escola tão amada e tão querida que, com o seu amor e seu carinho nos recebeu com tao boas vindas.
Entao os sonhos de um poeta, tornaram-se tortuosos pesadelos pelo que teve de assistir. Com lagrimas nos olhos, eu e várias pessoas assistíamos calados, sem nada poder fazer para defender a nossa escola-mãe. Como egoístas fomos forçados a nada fazer, somente olhar, chorar e calar. Um grito de socorro ecoava do coração deste poeta ao ver cada material daquela velha escola sendo jogado no chão, sem ao menos se importarem com os olhos rasos e serenos d'agua daqueles que tanto a amavam. Com muita dor em meu peito eu chorava, mas tinha que suportar a chegada do progresso com a destruição da velha casa. Cada sala de aula continha duas enormes janelas, e na dos fundos (sala 3) aviam 3 janelas. A tudo assisti calado, e em soluços e lágrimas meus colegas e eu, relembrávamos daquela que nossos corpos e nossas vidas acolheu, mas sobre nossos olhos pereceu. Tudo o que nos restou foi assistir sua destruição, enquanto nada podiamos fazer para defender nossa Velha Idalina de Freitas.
Meu coração doía ao assistir cada tábua, cada prego, cada pau, cada telha, e cada uma de suas janelas que ao chão eram jogadas como se nenhum valor tivessem.
Assim a vida daquela escola ali chegou ao fim.
Uma nova escola nasceu, mas a velha escola desapareceu, mas vive até hoje e para todo o sempre, dentro do coraçao deste poeta, pois ela jamais será esquecida.

Minha velha escola querida
Eu jamais te esquecerei.
Por toda a mina vida,
No meu peito a carregarei.
Lembro-me que a mim escolhestes.
Fazendo de minhas tristezas uma festa.
Receba, minha saudosa escola,
Um abraço desde aluno e poeta.
Por mais longos que sejam os meus dias,
Em nenhum momento esquecerei de você.
Receba minha escola querida,
Um beijo do teu aluno e poeta, Carlinos J.C.







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